A Comissão Europeia
liderada por Jean-Claude Juncker tem entre os seus porta-vozes algumas
simpáticas e jovens meninas, que são muito despachadas a falar e matam os temas
mais delicados rapidamente e com ares definitivos. Mas há assuntos que merecem
bem mais que meia dúzia de palavras proferidas por simpáticas ninfetas.
A
propósito da não venda do Novo Banco e do seu impacto sobre o défice de 2014,
que sobe para 7,2%, a porta-voz da Comissão Europeia disse apenas que, no
entender de Bruxelas, tal resultado não coloca em causa o processo de
consolidação orçamental em Portugal. Fim de conversa. Mas não devia ter sido.
Em
primeiro lugar, na União Europeia vigora a regra da contabilidade nacional
(ótica de caixa) para os orçamentos dos Estados-membros, e não a ótica dos
compromissos, como no caso da contabilidade pública. O que é que isto quer
dizer? Que se a regra fosse aplicada, os 3900 milhões que o Estado colocou no
fundo de resolução do BES deveriam ter sido imediatamente contabilizados no
défice do ano passado, quando a operação ocorreu. No caso do processo de
resolução de bancos (pela primeira vez experimentado pela Comissão no caso
português), existe supostamente um período de dois anos para o resultado da
operação ser inscrito no orçamento.
Foi,
aliás, isso, que o Governo entendeu dizer em 2014: que o valor em causa
entraria no orçamento nacional logo que fosse concluída a venda. E, para isso,
o Banco de Portugal não só despediu Vítor Bento (que não concordava com a
estratégia e queria dois anos para estabilizar o Novo Banco), como deu como
missão a Stock da Cunha a venda da instituição no prazo mais rápido possível
(porque, como doutamente explicou há uns meses o primeiro-ministro, quando mais
tarde se vender, menor será o seu valor; a explicação mudou agora, mas isso não
interessa nada).
Falhada
no entanto a venda – e falhada porque há inúmeras incertezas
quanto aos processos judiciais em curso e quanto aos resultados dos testes de
stress que em Novembro o BCE fará ao Novo Banco, pelo que não é possível saber
qual o aumento de capital que a instituição vai necessitar – aparece agora o INE a
incluir os tais 3900 milhões no défice de 2014, com a ministra
das Finanças a dizer logo que se trata de uma mera operação contabilística.
600 milhões das pensões
são um problema. 3900 milhões aplicados no Novo Banco não. Esperemos que a
ninfeta de Bruxelas nos explique isto, muito devagarinho, para nós percebermos
bem.
Bom,
mesmo que fosse – e não é, os 3900 milhões existem e foram
emprestados pelos contribuintes – justificava-se seguramente uma explicação
sobre esta mudança de atitude da Comissão, porque, como é óbvio, a leitura
política que hoje é feita sobre a derrapagem do défice, seria completamente
diferente se ela tivesse sido concretizada logo no ano passado.
Mais:
se nos casos da resolução de bancos existe uma situação de transição de pelo
menos dois anos que permite só registar a operação após a venda, então não se
percebe porque é que os 3900 milhões são agora registados no défice de 2014,
quando se deveria aguardar o resultado da venda para saber o resultado final da
operação. Afinal, só passou um ano e dois meses sobre a resolução do BES.
Estamos,
pois, perante uma situação que a Comissão Europeia deveria esclarecer
cabalmente e seguramente e não através de uma das suas ninfetas. Torna
seguramente a explicação mais agradável, mas eventualmente menos cabal. E
qualquer porta-voz não tem autonomia para responder a algumas questões mais
específicas e delicadas.
Uma
última nota: o facto da ministra das Finanças insistir em que não haverá nenhum
problema, nem com as metas do défice nos próximos anos, nem com a necessidade
de novas medidas de austeridade, mesmo que seja necessário recapitalizar o Novo
Banco e/ou o Fundo de Resolução, prova que há uma nova teoria económica em
nascimento. Agora, 3900 milhões de euros de financiamento ao Fundo de Resolução
garantidos pelo Estado, que podem ter de ser aumentados e no final do negócio
não serão com grande probabilidade compensados não têm nenhum impacto do ponto
de vista orçamental – quando verbas bem mais pequenas para outras rubricas são
uma enorme dor de cabeça para Maria Luís Albuquerque. É o chamado orçamento
vudu. 600 milhões das pensões são um problema. 3900 milhões aplicados no Novo
Banco não. Esperemos que a ninfeta de Bruxelas nos explique isto, muito
devagarinho, para nós percebermos bem.
Sem comentários:
Enviar um comentário