quinta-feira, 2 de outubro de 2014

(Opinião) Como abrir as listas partidárias nas eleições legislativas?

Uma opinião a ter em conta para a abertura a escolha de deputados aos cidadão. Artigo de Marina Costa Lobo e José Santana Pereira, Instituto de Ciências Sociais da UL. 
"Portugal é um dos poucos países na UE em que os cidadãos não podem exprimir quaisquer preferências em relação aos candidatos parlamentares nos boletins de voto.
Apesar da reforma do sistema eleitoral ter sido, desde meados dos anos 90 um tema de debate entre partidos – e ter voltado recentemente à agenda política, durante a campanha das primárias do PS - a verdade é que nada foi feito para mitigar o crescente sentimento de distância entre eleitores e eleitos. A única reforma implementada foi a redução do número de deputados de 250 para 230, no seguimento da revisão constitucional de 1989. Portugal é por isso, um dos poucos países na UE em que os cidadãos não podem exprimir quaisquer preferências em relação aos candidatos parlamentares nos boletins de voto. Uma abertura das listas partidárias nas eleições legislativas teria o mérito de retirar aos partidos o monopólio da escolha da classe política, dando alguma discricionariedade merecida aos cidadãos.
Concordando com o princípio da abertura das listas partidárias, existem várias opções, desde listas abertas a listas ordenadas, passando pelo voto único transferível. Tendo em conta a manutenção da dimensão dos círculos eleitorais, desaconselham-se soluções que favoreçam o excesso de concorrência entre candidatos do mesmo partido. Num sistema de listas totalmente abertas, quanto maior for a dimensão do círculo, maior o incentivo do candidato para estabelecer uma relação directa com o eleitor – transformando-se a eleição numa competição entre candidatos, em vez de entre partidos. Num país como Portugal, o efeito da adopção de um sistema de listas abertas seria a forte personalização das eleições, que iria obscurecer a importância dos partidos, dos programas e das escolhas ideológicas, porque os círculos eleitorais mais importantes em Portugal têm todos uma grande dimensão. O resultado seria não só o enfraquecimento dos partidos, mas também um parlamento composto por estrelas da televisão e milionários.
Defendemos, assim, uma abertura parcial das listas, através da implementação de um sistema de listas pré-ordenadas. O que se pretende pois é permitir a expressão de preferências, sendo que a ordem dos candidatos é pré-estabelecida pelo partido, podendo ou não ser legitimada pelo eleitorado, consoante o número de votos que os candidatos obtêm. O modelo que propomos é semelhante ao utilizado nos Países Baixos, após a reforma eleitoral de 1998 (para mais pormenores, é favor consultar o artigo da nossa autoria que será distribuído na “Conferência da Gulbenkian – Afirmar o Futuro” nos dias 6 e 7 de Outubro de 2014).
Com este sistema, a responsabilidade sobre a composição das listas seria partilhada entre partidos e eleitores. O partido continua a estruturar as listas, mas são os eleitores que têm a última palavra sobre a ordem dos candidatos. Não se colocam demasiadas barreiras à efectivação das preferências, mas é preciso que haja alguma mobilização por parte dos cidadãos para que esta ocorra. É fomentada a concorrência intrapartidária, mas mantém-se também a força de coordenação dos partidos no centro, por forma a não eliminar a disciplina partidária do trabalho parlamentar. Sendo certo que, sozinha, esta medida não irá por si só resolver todos os problemas do sistema político, seria um passo importante no reequilíbrio de poder entre partidos e eleitores, devolvendo aos cidadãos algum poder na formação da classe política.
Marina Costa Lobo e José Santana Pereira, Instituto de Ciências Sociais da UL"


Sem comentários:

Enviar um comentário